Justiça feminina

Lembro sempre de uma professora que marcou a minha caminhada na Licencitura em Pedagogia e ela dizia sempre: "Me reconheço nas mulheres que me fazem vibrar por ser mulher! E me recuso a ser mulher quando vejo alguém não assumindo este papel no seu mais alto significado."
Esta frase que marcou esta caminhada e me faz ser a profissional que sou e a expressar isto em meu trabalho como professora universitária, foi trazida a baila por certo facto que passo a narrar.
Hoje, assisti pela manhã o programa Companhia das Manhãs da SIC, na altura da secção do Registo Criminal, onde denunciavam o resultado de um processo que deixava um violador de uma menina de 11 anos em liberdade e culpabilizavam a mãe pelo acontecido.
O assunto me chocou, não só pelo tema em questão, que deve chocar qualquer mulher (e penso, qualquer pessoa) em qualquer altura da sua vida.
Me chocou também o facto daquela mãe ser culpabilizada pelo que aconteceu. Podemos, nós mulheres cercarmos nossos filhos de atenção - se o tivermos (não sou mãe), e isentá-los e imunizá-los de toda agressão? Que mãe tem tempo e concebe prever, intuir que seu filho está sendo vítima desta ou daquela agressão? Se assim o fosse, as mães perceberiam quando seus filhos sofressem todo os tipos de abusos: o do booling, da violação, entre outros. Isto não desobriga as mães de estarem atentas a qualquer mudança de comportamento dos filhos. Não é isto que quero dizer.
Não consigo me ver na mulher que é esta juíza que sentencia a mãe e deixa em liberdade um violador, pedindo que ele tente não se deixar levar novamente pelo desejo de violar outra criança ou quem sabe a mesma criança! Passa-se paninhos quentes no agressor e agride-se a vítima onde deveria se fazer justiça!
Onde estamos, afinal?
Culpa-se a mãe! E aí está um sinal da mentalidade deste país quanto ao papel das mulheres na sociedade e na constituição da família. A mulher portuguesa - e não só ela! (vejam as estatísitcas com relação as mulheres russas mortas sob violência doméstica) - carrega sobre os ombros pesados fardos. Afinal, quantas coisas passam ao longe na visão de qualquer pessoa! Até as mães de família são falíveis!
E deixa-se livre um homem doente com a possibilidade de vir a causar estragos em outras famílias ou na mesma família (fora os estragos que já existem!)! E tudo porque a justiça acreditou nas desculpas que ele alegou: "Foi ela quem me pediu"! Que criança de 11 anos pede a um homem que lhe viole?!!!
Desculpem a força do desabafo e a crueza das palavras, mas o caso me chocou muito.
Não conheço todos os meandros do processo, mas lembro de certo artigo que uma advogada brasileira publicou anos atrás e que dizia: "Anos atrás quando uma mulher era violada, isto era um tabu. Ela não falava sobre isso. Era uma vergonha. Hoje, com todos os aparatos e organismos sociais e jurídicos, acredita-se que quando uma mulher diz que foi violada, é porque foi mesmo!"
Sabemos que há casos e casos em que isto é ou não verdade, mas o que me incomodou neste caso, foi de facto a repreensão da justiça sobre a mãe pelo acontecido a filha.
E fica aqui algumas questões: quem está em julgamento? quem tem ser culpabilizado pelo que aconteceu? Como podemos proteger as verdadeiras vítimas? E que sociedade estamos produzindo, lutando para constituir?
Fica aqui o desabafo de uma cidadã que não vê certos factos e cruza os braços de uma forma passiva. Fica o convite a alguma reflexão e quem sabe alguma reacção de alguém que possa de facto impedir que estes monstros continuem em liberdade. Lembro que uma pessoa não pode ser julgada duas vezes pelo mesmo crime. Portanto, teremos que esperar que ele -o violador deste episódio- agrida outra pessoa até que se faça verdadeira justiça? Se é que a farão! E a justifica-se o descrédito que todos vivemos em torno da justiça (que só é feita para alguns) e na política (que neste momento, também se isenta de rever certos ajustes jurídicos ou não, que já não beneficiam a sociedade actual).
Deixo aqui também a recomendação para verem um filme que também é um a denúncia, chamado "Tráfico Humano".
Finalizo dizendo que ainda me reconheço em todas as mulheres que lutarem contra qualquer injustiça seja ela de que tamanho, em todo e qualquer espaço e sobre toda e qualquer pessoa!

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